ADITAL, 19/09/2011

por Camila Queiroz

Jornalista da ADITAL

No último dia 15, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) do Brasil aprovou, com 15 votos a favor, cinco pedidos de diligência e duas abstenções, a liberação comercial do feijão transgênico, desenvolvido por pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Dias antes, 15 membros da Comissão haviam endossado abaixo-assinado na Internet pedindo a liberação do feijão.

O envolvimento pessoal de membros da CTNBio com a matéria votada é condenado por lei, sob possibilidade de perda de mandato. Frente a isto, a Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA) e a Articulação do Semi-Árido Brasileiro (ASA) enviaram duas representações ao Ministério Público Federal pedindo que o órgão declare as 15 pessoas que puxaram o abaixo-assinado impedidas de votar e, em consequência, revogue a decisão da reunião da CTNBio até que sejam realizados mais estudos sobre o feijão transgênico.

“O que eles fizeram é como se um juiz antecipasse a todo mundo, no dia anterior ao julgamento, a sentença que vai proferir”, compara o assessor técnico da AS-PTA, Gabriel Fernandes.

Ele explica que já em agosto o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) enviou documento à Presidência da República e ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) explicitando a necessidade de mais estudos antes da liberação do transgênico. Mesmo assim, a votação na CNTBio transcorreu normalmente.

De acordo com Gabriel, o pedido do Consea se baseia em irregularidades nas pesquisas sobre a planta, que não chegam a cumprir nem o estabelecido pela legislação brasileira. Enquanto a lei demanda testes em todas as regiões onde o feijão poderá ser plantado, a Embrapa os realizou apenas em três estados brasileiros – Paraná, Minas Gerais e Goiás, durante dois anos. “A gente não sabe, por exemplo, o impacto se o feijão for plantado no semi-árido”, disse.

O período é outra irregularidade, uma vez que a lei determina realização de testes durante, no mínimo, duas gerações de animais e em animais prenhes. No caso do feijão transgênico brasileiro, houve testes em apenas uma geração.Foram testados dez ratos, da mesma espécie (mais uma irregularidade), e apenas três foram analisados, todos machos. Este é um ponto preocupante, pois no caso do milho transgênico pesquisas mostraram que o grão afeta diferentemente homens e mulheres.Identificou-se ainda tendência de diminuição no tamanho dos rins e de aumento do peso do fígado dos três ratos, e o feijão foi liberado sem que houvesse resposta para o problema, ressalta o assessor técnico.

Prova da superficialidade dos estudos é que o representante do Ministério da Saúde na CTNBio votou por diligência, apontando necessidade de pesquisas mais profundas. Ele argumentou que as poucas informações disponíveis inviabilizam a criação de um sistema de vigilância em saúde que possa identificar potenciais efeitos adversos da nova semente quando cultivada e consumida em escala.

Vírus

Os pesquisadores desenvolveram a modificação genética para combater o vírus do mosaico dourado, transmitido por moscas brancas. Contudo, Gabriel aponta que nem nesse quesito a eficácia é comprovada. A primeira geração de sementes originadas do feijão transgênico apresentou até 36% de plantas suscetíveis ao vírus.Segundo o assessor, os pesquisadores também não conseguem explicar como a modificação genética torna o feijão resistente ao vírus, assim como não têm explicações para as falhas. “Eles disseram, com todas as letras, que o mecanismo é bastante complexo e para ser entendido ainda precisa ser bastante estudado”, enfatiza.