O jornal gaúcho Correio do Povo publicou uma grande reportagem (de capa) no último domingo (23/08) sobre a falta de controle e fiscalização quanto à contaminação de lavouras de milho convencional por variedades transgênicas.

Além de divulgar a nota técnica elaborada pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado do Paraná — que constatou a falta de fiscalização do governo federal quanto ao cumprimento das regras de isolamento das lavouras de milho transgênico determinadas pela CTNBio e questionou a própria eficácia das normas — a matéria gaúcha relata que o descontrole também é total no Rio Grande do Sul:

Terceiro maior produtor de milho do país, o Rio Grande do Sul não tem controle sobre o cumprimento das regras de plantio de milho transgênico, determinadas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Na safra passada, o governo federal não fiscalizou a execução das normas, estabelecidas para evitar a contaminação de áreas convencionais. A comissão exige distância mínima de 100 metros entre a lavoura de milho geneticamente modificado e a comum, espaçamento que pode cair para 20 metros se houver um refúgio de 10 metros no entorno.”, diz o jornal.

Tudo isso a gente já sabia… Mas a grande novidade desta reportagem é a declaração do representante do Ministério da Agricultura no RS dizendo que não é atribuição do ministério fiscalizar. Mais ainda: ele delega a responsabilidade para “o produtor”!

Eis a reprodução do trecho:

De acordo com o responsável técnico pela fiscalização de sementes e transgênicos do Ministério da Agricultura no Rio Grande do Sul (Mapa/RS), Francisco Gama, a inspeção não foi realizada por falta de pessoal e de kits de teste rápido. Para a safra 2009/2010, o Mapa pretende contornar as falhas colocando quatro técnicos a campo no Estado a partir de setembro. Pela escassez de pessoal, serão priorizadas áreas com variedades crioulas e cultivo orgânico. ‘Será uma referência, senão seria como procurar agulha no palheiro.’ Contudo, o superintendente do Mapa/RS, Francisco Signor, afirma que a fiscalização não é atribuição do ministério. ‘O produtor é que tem que tomar conta. Se misturar, será problema‘, diz.” (grifo nosso).

Primeiro, o Ministério da Agricultura abriga os interesses das multinacionais de transgênicos e agrotóxicos e faz o possível e o impossível para viabilizar a liberação de transgênicos no país, com a promessa de que no Brasil havia espaço para todos os tipos de agricultura. Uma vez liberadas as sementes transgênicas, o mesmo ministério não cumpre sua obrigação de fiscalizar o cumprimento das normas que, em tese, evitariam a contaminação. Em seguida, ao ser informado oficialmente por uma secretaria estadual de agricultura de que contaminação está rolando solta, permite que seus representantes na CTNBio desqualifiquem a informação técnica, maliciosamente classificando-a de “especulativa e cheia de vazios de informação” (O Estado de S. Paulo, 21/08/2009). E, por fim, tem a audácia de ir a público dizer que a fiscalização não é sua atribuição, lixando-se para o “problema” que os produtores terão se não fizerem o seu (do Ministério) trabalho.

Surreal.