JORNAL DO COMERCIO – PE, 20/12/2011

EDITORIAL – A denúncia não é nova nem o problema desconhecido: a população brasileira consome volume inaceitável de agrotóxicos, que chegam disfarçadamente nas frutas e verduras colocadas nas gôndolas dos supermercados, das feiras livres, das lojas de hortifrutigranjeiros distribuídas pelo País. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está preparando um protocolo através do qual fiscalizará os pontos de venda, especialmente os supermercados, que poderão ser punidos pela venda de tais produtos. Uma pesquisa da própria Anvisa mostra alguns dados assustadores: o pimentão (91% das amostras), o morango e o pepino são os alimentos mais contaminados, representando alto risco para a saúde dos consumidores.

Mas essa é apenas uma pequeníssima ponta do iceberg e o Brasil está entre os cinco maiores consumidores de agrotóxicos no mundo, o que não nos dá a mais remota satisfação. Pelo contrário, vemo-nos, assim, diante de um tremendo desafio. Mais ainda quando se toma conhecimento de pesquisa da Organização Pan-Americana de Saúde na América Latina e no Caribe, dando conta de que o envenenamento por produtos químicos representa 15% de todas as doenças profissionais notificadas. Noutra face do problema, a Organização Mundial de Saúde informa que há 20 mil óbitos por ano em decorrência da manipulação, inalação e consumo indireto de pesticidas e que 70% dos casos de intoxicação acontecem em países em desenvolvimento. O manuseio inadequado de agrotóxicos é um dos principais responsáveis por acidentes de trabalho no campo.

Parece-nos que o nosso País está suficientemente amadurecido para dar um tratamento mais rigoroso a esse tipo de problema, da mesma forma como vem fazendo em relação a outras atividades e produtos que atingem a saúde dos brasileiros. Assim como quando proíbe a propaganda de bebidas alcoólicas ou quando age com dureza contra o cigarro. Há, em qualquer desses casos, um mercado produtor e um mercado consumidor sujeitos aos riscos do processo de produção e de consumo. Quando incluímos as lavouras nesse quadro de risco, fica evidente que também o agricultor – particularmente o produtor mais humilde ou o empregado responsável pela aplicação do agrotóxico – é vítima, tanto quanto agente do processo de envenenamento da produção.

A questão é de tal forma grave que até se torna difícil a defesa do uso de defensivos agrícolas em nome da produtividade e do emprego. O impacto negativo, com consequências graves em curto, médio e longo prazos justifica políticas públicas que instalem, definitivamente, o predomínio da cultura orgânica como o único processo habilitado a receber recursos e incentivos públicos, de tal forma a trazer a produção desenvolvida em condições perfeitamente saudáveis para todos ao mesmo patamar de mercado que têm hoje aquelas carregadas de pesticidas, fungicidas, herbicidas, responsáveis por doenças e mortes em larga escala.