Valor Econômico, 05/02/2015

Por Jacob Bunge

No primeiro semestre do ano passado, pela primeira vez em 20 anos, o agricultor americano Jim Benham usou em sua lavoura só sementes de soja que não haviam sido geneticamente modificadas para resistir a herbicidas.

Não foi porque ele decidiu, de repente, abraçar o movimento contra os transgênicos. Benham foi atraído por um prêmio de quase 14% no preço que uma exportadora de grãos estava oferecendo pela soja não transgênica, que era vendida a processadores de alimentos na Ásia.

Benham, que tem 63 anos e é do Estado de Indiana, integra um grupo pequeno, mas crescente, de produtores do Meio Oeste dos Estados Unidos que estão se afastando das sementes transgênicas em resposta a uma queda nos preços dos grãos que vem corroendo o lucro dos agricultores nos últimos dois anos.

Mais consumidores estão procurando alimentos com ingredientes não transgênicos, que são promovidos como mais saudáveis e mais favoráveis ao meio ambiente. As vendas no varejo dos EUA de cereais, molhos, ovos e outros produtos livres de ingredientes transgênicos subiram 15% em 2014, para US$ 9,6 bilhões, colocando-os entre os segmentos da indústria alimentícia que mais crescem no país, segundo a Nielsen NV.

Fornecedoras de alimentos embalados, como a General Mills Inc. e a Unilever PLC, estão impulsionando essa tendência ao eliminar ingredientes geneticamente modificados de alguns produtos.

As empresas de alimentos pagam um preço mais alto por grãos e oleaginosas não transgênicos devido à oferta relativamente pequena e ao custo de separar essas culturas das geneticamente modificadas, que dominam o cinturão agrícola americano. “Tive lucro porque troquei [de sementes]”, diz Benham. “As margens são tão críticas no nosso negócio que vamos atrás de alguns dólares sempre que podemos.”

Culturas biotecnológicas – que usam sementes geneticamente modificadas desenvolvidas por empresas como Monsanto Co., DuPont Co. e outras – estão hoje amplamente disseminadas na agricultura, com seu uso crescendo rapidamente desde que foram introduzidas, há 19 anos, embora esse avanço tenha começado a se estabilizar. Em 2014, 94% da área plantada de soja nos EUA usou sementes transgênicas, o mesmo que em 2011, mas bem acima dos 54% de 2000, segundo dados do Departamento de Agricultura dos EUA. A área semeada com milho transgênico, por sua vez, subiu de 90% do total em 2013 para 93% no ano passado, ante só 25% em 2000.

No Brasil, o uso de sementes transgênicas de soja e milho também deslanchou nos últimos anos, dizem produtores e analistas. Nas lavouras de milho da região produtora do Centro Sul, por exemplo, o emprego de sementes transgênicas subiu de 4,9% em 2009 para 85,7% no ano passado, na média das duas safras anuais, estima Paulo Molinari, consultor da firma Safras & Mercado. “O transgênico acabou com a lagarta que prejudicava muito a produção brasileira de milho e isso acabou atraindo cada vez mais agricultores”, diz ele.

Mas a soja não transgênica também já gerou prêmios de preço no Brasil, diz Luiz Nery Ribas, diretor técnico da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja). Um programa da associação para incentivar culturas não transgênicas, porém, fez a área plantada com sementes tradicionais subir para perto de 20% no Estado, o que ampliou oferta e praticamente acabou com os prêmios, diz Ribas. Mato Grosso é o maior produtor de soja do Brasil, respondendo por 31,4% do total da safra 2013/2014, segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Nos EUA, muitos agricultores dizem que as culturas transgênicas também ajudam a aumentar a produtividade e podem reduzir o uso de pesticidas porque algumas plantas transgênicas produzem suas próprias toxinas que matam as pragas. Mas os preços do milho no país despencaram cerca de 50% nos últimos dois anos, enquanto os da soja caíram quase 35%, o que levou alguns agricultores a reviver as lavouras não transgênicas como forma de preservar os lucros.

Vários produtores do Meio Oeste que fizeram a troca dizem que seus motivos são econômicos, não um gesto de apoio ao movimento ativista contra culturas geneticamente modificadas que vem ganhando força nos EUA. Críticos da biotecnologia agrícola dizem que são necessárias mais pesquisas para garantir que alimentos que contêm ingredientes geneticamente modificados são seguros para o consumo. A FDA, agência que regula as indústrias de alimentos e remédios nos EUA, e muitos grupos de saúde e ciências do país afirmam que os alimentos produzidos com transgênicos são seguros.

“Estamos vendo um interesse maior do que nunca na produção para o mercado de não transgênicos”, diz Lynn Clarkson, diretor-superintendente da Clarkson Grain Co., empresa de Illinois que contrata agricultores para plantar lavouras não transgênicas. “A queda nos preços [das commodities agrícolas] fez muitos agricultores ficarem no ponto de equilíbrio ou terem prejuízo na safra de 2014.”

A mudança está impulsionando as vendas de alguns pequenos fabricantes americanos de sementes especializados em culturas não transgênicas. As vendas dessas sementes na Albert Lea Seed House Inc., por exemplo, devem saltar cerca de 20% este ano e algumas variedades já estão esgotadas, diz Mac Ehrhardt, um dos donos da empresa, que faturou US$ 24,5 milhões no ano passado. Muitas dessas vendas são para agricultores que estão tentando economizar dinheiro comprando sementes não transgênicas, que normalmente são mais baratas que as versões biotecnológicas, diz ele.

Wendel Lutz, que cultiva cerca de 200 hectares de soja em Illionois, diz que migrou completamente para as sementes não transgênicas e pretende plantar mais neste ano. “O dinheiro fala mais alto”, diz o agricultor de 57 anos, que garantiu um prêmio de US$ 2 o bushel para sua produção no ano passado.

(Colaborou Eduardo Magossi.)