Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST, 17/06/2012
Especialistas debateram no dia 16 de junho os malefícios dos alimentos geneticamente modificados no seminário Falsas promessas dos transgênicos e os movimentos de resistência, realizado na tenda Carmem da Silva.
Participaram do debate Ana Carolina Brolo, advogada da organização Terra de Direitos, Pat Mooney, Membro do Grupo de Ação sobre Erosão, Tecnologia e Concentração (ETC, sigla em inglês), Vandana Shiva, da Fundação por Tecnologia Científica e Ecologia da Índia (Navdanya) e Angelika Hilbeck, da Rede Europeia de Cientistas pela Responsabilidade Social e Ambiental.
Pat Mooney afirmou que os transgênicos e a biotecnologia não são a solução da crise alimentar, pois antes da liberação dos alimentos geneticamente modificados, havia 500 milhões de pessoas no mundo passando fome. Hoje, há mais de 1 bilhão. A ineficácia desses alimentos fica clara ao ver o que foi obtido ao longo dos 20 anos de pesquisas com transgênicos.
“A indústria biotecnológica gastou 16 bilhões de dólares em pesquisas para desenvolver transgênicos, o que é uma quantia maior que o investimento público em todas as áreas de tecnologia agrícola. E o que se tem para mostrar? Apenas quatro culturas capazes de resistir à veneno. O custo de pesquisa de um transgênico é 136 vezes mais caro do que o de uma planta normal. Então por que se investe dinheiro nesta tecnologia se está claro que ela não é a solução?”.
Impactos na Índia
Vandana Shiva analisou o impacto social da entrada da Monsanto na Índia. O país, grande produtor de algodão, que tinha milhares de variedades de sementes, agora conta com 95% de suas terras dominadas por apenas uma variedade, produzida pela Monsanto.
“A empresa dominou o mercado de sementes, por meio de um acordo com o governo chamado de substituição de sementes’, no qual se criaram leis que analisaram as sementes camponesas, que sempre foram utilizadas na Índia e, a partir de métodos industriais, elas foram consideradas ‘perigosas à saúde’. Além disso, a Monsanto subornou muitos fazendeiros para que estes abandonassem as sementes tradicionais pelas transgênicas”.
Com o surgimento da Monsanto na Índia, Vandana afirma que o preço para se produzir algodão aumentou mais de 25 vezes, e que a empresa lucra mais de 10 bilhões de dólares anualmente com os royalties das sementes. As patentes de sementes, segundo ela, são o único motivo da existência de transgênicos e da biotecnologia, que considera serem tecnologias desnecessárias. “Não precisamos da biotecnologia ou da biologia sintética. As ferramentas mais avançadas não justificam o caminho errado tomado”.
Por isso, Vandana integra um movimento que busca resgatar a soberania das sementes naturais da Índia e o fim das patentes. “Se abolimos as patentes, a biotecnologia pára, pois a sua única função é garantir o controle da biodiversidade. Em relação às sementes, precisamos fazer com que esse movimento assuma uma escala global. Precisamos nos organizar e dizer às corporações e governos que sabemos qual o futuro que queremos, e que somos nós que iremos moldá-lo”.
Angelika Hilbeck desmentiu todas as propostas que estão associados com os alimentos transgênicos. “A fome no mundo não acabou; pelo contrário, nos anos da revolução gênica (1995 a 1997) ela só aumentou. Se os transgênicos fizeram algo em relação à fome, foi agravar a situação de miséria, pois estes alimentos reforçam o modelo latifundiário, cuja maior parte da produção é destinada ao alimento de animais ou vai para as indústrias energéticas para se produzir combustíveis”.
Ela ressalta que outras promessas, como plantas específicas para a demanda dos produtores, o aumento da produtividade e a resistência às pragas também não foram cumpridas. Essa última, em especial, se agrava cada vez mais, pois os produtores estão tendo de recorrer à venenos antigos e perigosos para livrar a lavoura das pragas.
“Se os transgênicos são um produto falho, como as companhias conseguem vendê-los? Os produtos são secundários para as companhias; o que elas querem é manter o número de vendas alto para que as ações na bolsa de valores continuem altas. Então ao lançar uma nova semente, a companhia sabe que em 3 ou 4 anos as pragas terão resistência a ela, mas aí já deu tempo de se lançar um novo modelo, e assim por diante, mantendo o valor das companhias alto. É preciso termos em mente que não há uma tecnologia que vai acabar com a crise alimentar”.
Quadro no Brasil
Ana Carolina fez um paronama dos transgênicos no Brasil, ressaltando o papel da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) nos processos de liberação destes alimentos. “A CTNBio é uma organização que critica cada vez mais as leis regulatórias dos transgênicos, como a lei que exige estudos aprofundados desses organismos, considerada ‘caduca’ pela organização. A CTNBio não negou a liberação de nenhuma semente transgênica até hoje”. Segundo Leonardo Veloso, secretário de agricultura e membro do grupo de estudos em agrobiodiversidade, em seminário realizado ontem sobre o agrário brasileiro, os estudos dos transgênicos levam de 15 a 20 dias apenas. “Com esse tempo pequeno de estudo, nem o cigarro faria mal à saúde”.
Em relação às formas de resistências a estes alimentos, Ana apontou uma dificuldade. “Um problema de se debater transgênicos e mover ações contra as corporações e seus produtos é que somos obrigados a provar tudo o que dizemos, ao invés da empresa ter de fazer isso. Acontece que a maioria do conhecimento em relação a esses organismos está nas mãos das transnacionais”.
O debate é parte da Cúpula dos Povos, e foi organizado pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o Comitê Brasileiro de Estudos na Saúde (CBES) e conta com o apoio de movimentos sociais, como a Via Campesina.