A Poítica Nacional de Meio Ambiente já impõe ao poluidor obrigação de recuperar ou indenizar danos causados. O que o recém-criado protocolo suplementar ao Protocolo de Cartagena procura fazer é garantir que haja recursos disponíveis para indenização, e que estes saiam do bolso de quem lida com transgênicos e não da sociedade como um todo.
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Mauro Zanatta | Valor Econômico, 19/10/2010
Sob forte pressão dos outros 158 países signatários do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, o governo brasileiro aceitou incluir regras mais rígidas na Convenção da Biodiversidade que podem elevar custos do comércio e transporte internacionais de organismos geneticamente modificados.
Em reunião em Nagoya, no Japão, os negociadores do Itamaraty aceitaram a criação de um “seguro” para cobrir eventuais responsabilidades e compensações financeiras por danos ambientais causados por países exportadores de transgênicos, como o Brasil.
A mudança de postura do Brasil dividiu o governo. O Ministério da Agricultura era contra o seguro, mas o Meio Ambiente insistiu na criação de um novo mecanismo de proteção à biodiversidade. Diante do impasse, que se arrastava desde 2004, a Casa Civil interveio para garantir “voz única” ao governo na reunião. O texto foi aprovado na sexta-feira.
Empresas e produtores rurais temem o uso do seguro como uma barreira não-tarifária no comércio internacional de grãos. Cálculos preliminares indicam que o seguro poderia elevar em até US$ 500 milhões os custos apenas na cadeia produtiva da soja. Além disso, alega a indústria brasileira, os principais concorrentes nacionais – como Estados Unidos, Argentina, Austrália e Canadá – não ratificaram o acordo internacional, o que poderia prejudicar o comércio.
Nos bastidores, formuladores do governo informam ter aceito os termos do “protocolo suplementar” para evitar um “isolamento internacional” do país em um dos principais fóruns globais ambientais. Ao rejeitar a pressão de ONGs como determinante, fontes do governo admitem que foi necessário mudar a posição original de evitar qualquer compromisso financeiro. O governo avalia que, antes de vigorar, o “seguro” dependerá de legislações nacionais e terá que ser submetido ao crivo do Congresso.
“Não foi nada compulsório. É só um indicativo. Tínhamos que dar um passo. Éramos refratários, mas diante do cenário de tendência de isolamento internacional, optamos por admitir o seguro em leis nacionais”, informou uma fonte do governo. O governo avalia não ter havido “ruptura nem mudança drástica” na posição.
A reunião do Japão não entrou em outros detalhes polêmicos. Os negociadores não incluíram diferenciações entre o grão transgênico e seus derivados ou subprodutos. O texto tratou de forma vaga esta definição e prevê, antes de uma criação efetiva, a realização de estudos sobre modalidades de seguro e seus impactos ambientais, econômicos e sociais. “Eles também deixaram em aberto o conceito de “operador”. Quer dizer, se a responsabilidade é da cadeia produtiva, da empresa exportadora, de quem desenvolveu a tecnologia ou do produtor”, afirma o especialista Gabriel Fernandes, da AS-PTA. Assim, ainda está indefinida a responsabilidade por eventual indenização. “Esse acordo tem pouca consequência prática. O Brasil pensa mais como exportador de grãos do que como um país megadiverso”.
Em 2006, o Protocolo de Cartagena já havia desatado forte confronto no governo ao obrigar o uso da expressão “contém” para identificar um determinado tipo de transgênico, a partir de 2012, em todos os documentos de trânsito. Até então, a exigência restringia-se ao termo “pode conter”. A bancada ruralista da Câmara exigirá a ratificação pelo Congresso das modificações feitas no texto para evitar potenciais travas comerciais.
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