Avicultores do Nordeste negociam importação de milho da Argentina

VALOR ECONÔMICO, 31/03/2011

Os produtores de aves do Nordeste enfrentam um grave dilema para abastecer 100 milhões de frangos com milho geneticamente modificado da Argentina. Diante da necessidade de importar a matéria-prima a preços razoáveis, os avicultores da região correm o risco de ter suas cargas rejeitadas nos portos pelas autoridades brasileiras.

Um problema não resolvido pelos ministros do Conselho Nacional de Biossegurança (CTNBio) [CNBS], que ainda não decidiu se essa importação atende aos “interesses nacionais”, uma vez que a situação ameaça a produção de aves da região cuja demanda mais cresce no país. Desde 2008, os 11 ministros avaliam pedidos de importação de milho transgênicos argentino, mas a situação está longe de ser decidida.

Os avicultores de Pernambuco e Ceará, dois dos maiores produtores nordestinos, já começaram as negociações para adquirir o grão de fornecedores da Argentina. Ocorre que o país vizinho autorizou a liberação comercial de três variedades que ainda não foram avalizadas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Como [não] há garantia de segregação das sementes, o produto não autorizado pode entrar no Brasil via Nordeste.

 

“O governo não honrou o compromisso de colocar milho do Centro-Oeste aqui a custo compatível. Então, vamos importar”, avisa o presidente da Associação Cearense da Avicultura (Aceav), João Jorge Reis.

 

A Argentina já liberou a produção comercial dos produtos transgênicos “176”, da antiga Ciba-Geigy, “T25”, da AgrEvo, e “MON89034x88017”, da americana Monsanto. Os três não têm autorização comercial no Brasil.

 

A União Brasileira da Avicultura (Ubabef) admite os problemas com a região Nordeste. E agrega que a mesma situação é vivida por Rio Grande do Sul e Santa Catarina. “Temos defendido a autorização do milho argentino porque não somos autossuficientes em vários Estados. Reiteramos esse pedido recentemente ao ministro Wagner Rossi. É uma questão de logística e de preço”, sustenta o diretor de produção da Ubabef, Ariel Mendes. Ele informa que ainda não houve decisão oficial sobre o caso porque há “pressão forte” dos produtores de milho contra a importação.

 

Os produtores de aves do Nordeste calculam que a saca de milho brasileira chega a R$ 42 na região. O milho argentino, com frete de navio desde Buenos Aires, chegaria a R$ 34. “No auge da produção aqui, temos apenas um quinto do milho necessário”, alega João Reis, da Aceav.

 

“O governo tem estoque regulador de 5,5 milhões de toneladas de milho, mas os leilões não cobrem a paridade da importação”, afirma o dirigente.

 

O Ministério da Agricultura lembra que tem realizado leilões para abastecer a demanda do Nordeste, mas que questões ligadas à logística e aos preços de mercado dificultam a garantia de fornecimento do milho estocado nos armazéns oficiais.

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G1, 28/03/2011 18h56 – Atualizado em 28/03/2011 19h26

Frete caro no Brasil faz Nordeste buscar milho na Argentina

Última vez em que houve aquisições expressivas foi na safra 2003/2004.
Para importar, é preciso lotar um navio, com, no mínimo, 30 mil toneladas.

Da Agência Estado

Criadores de aves e suínos do Nordeste deram início às negociações para importar milho da Argentina. Com os altos preços do frete no mercado interno, em razão do escoamento da safra de soja, os criadores voltaram a encontrar no país vizinho produto mais barato e em maior quantidade. A última vez em que foram reportadas aquisições expressivas do grão argentino foi na safra 2003/2004, quando a região enfrentou problemas de abastecimento.

Fontes do mercado informam que na Paraíba os negócios já foram concretizados e compreendem um navio de 20 mil a 30 mil toneladas. No Ceará, a expectativa é que a decisão seja tomada na próxima quinta-feira. O presidente da Associação Cearense de Avicultura, João Jorge Reis, informou que até lá o contrato deve ser fechado. O produto chegaria a Fortaleza por R$ 31/saca CIF.

Segundo cálculos da associação, o grão obtido via leilão de Valor de Escoamento do Produto (VEP) da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) chegaria a R$ 42/saca na última quinta-feira. De acordo Reis, a dificuldade é reunir recursos para a importação da Argentina, uma vez que é preciso lotar um navio, com, no mínimo, 30 mil toneladas. “O preço final está muito convidativo”, afirma. O produto levaria 30 dias para chegar ao Estado.

A decisão coloca em xeque a intervenção da Conab no mercado do grão. Realizados desde janeiro, os leilões de VEP deixaram de atrair progressivamente o interesse dos compradores. Na oferta mais recente, de quinta-feira passada, apenas 1,9 mil toneladas (3,5%) das 53,2 mil toneladas de Mato Grosso colocadas à venda foram negociadas. Contudo, a companhia segue realizando as ofertas. “Trabalhamos com regras que nos são impostas”, justifica o analista de mercado da Conab, Thomé Guth.

Os prêmios e os preços são definidos conforme a portaria interministerial 568. Os valores são estabelecidos por uma equação que leva em consideração, entre outros itens, a paridade de importação. Entretanto, com o alto frete pago para escoar o produto internamente, em função do período de escoamento da safra de grãos, o valor não está valendo a pena para os consumidores nordestinos. Guth ainda pondera que, se o custo de logística fosse mais baixo, os compradores do Nordeste buscariam o produto no mercado interno.

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) discorda das importações. “Isto é anticoncorrencial e terá um impacto negativo para o setor. O mercado vai estar abastecido com produto de fora quando a safrinha chegar”, avalia Gustavo Prado, assessor técnico da comissão de cereais, fibras e oleaginosas. Para ele, a situação mostra que os preços praticados pela Conab não estão corretos. “A CNA vai intervir e negociar com o governo para que as importações não aconteçam”, diz.

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Milho caro faz Nordeste olhar Argentina

Algumas tradings de grãos já fizeram consultas sobre a possibilidade de importação de milho argentino para o Nordeste. A alta dos preços internos já está perto de tornar a operação compensadora.

VALOR ECONÔMICO, 09/02/2011

O preço do milho alcançou patamar tão elevado no mercado doméstico que já se aproxima dos valores do produto originado na Argentina. No Nordeste, que há cerca de oito anos não compra volumes significativos de grão do país vizinho, a cotação do milho está na casa de R$ 34 a R$ 35 por saca. O milho argentino posto em fábricas próximas ou a cerca de 100 quilômetros dos portos nordestinos sairia por R$ 35 a R$ 35,60, considerando um preço de US$ 285 por tonelada, para entrega em março, conforme cálculos de traders.

 

Apesar da escassez de oferta de milho no mercado doméstico, nesse nível ainda não é viável importar o produto argentino, de acordo com fontes do mercado, mas tradings de grãos que atuam no Brasil já fizeram consultas sobre essa possibilidade.

 

A última vez em que empresas de aves e suínos do Nordeste fizeram importações expressivas de milho da Argentina foi em 2003, quando houve problemas de abastecimento na região, tradicionalmente uma compradora de milho de outros Estados brasileiros. Na ocasião, os negócios viraram caso de Justiça, já que o milho transgênico – a Argentina planta praticamente só grão modificado – era proibido no Brasil. Agora, está liberado.

 

Apesar de os preços no Nordeste não estarem muito distantes da paridade de importação, analistas acham difícil que ocorram compras de milho argentino, principalmente no primeiro semestre deste ano. A razão é que o início da colheita do grão no Brasil, ainda que atrasado, deve aliviar o quadro de oferta e de preços do produto.

 

“Tudo vai depender de como será a safrinha. A importação é um plano B”, comentou Paulo Molinari, da Safras & Mercado. Ele se refere à segunda safra de milho, cujo plantio já está atrasado por conta da lentidão na colheita de soja. O grão é plantado em áreas cultivadas com a oleaginosa na safra de verão. O produto é semeado entre 15 de fevereiro e 30 de março, e há temor no mercado de que problemas climáticos afetem a safrinha de milho.

 

Molinari observa ainda que a safra de milho da Argentina deve recuar em relação ao ciclo anterior. Afora isso, as exportações de milho dependem de licenças do governo argentino, limitadas, por enquanto, a cinco milhões de toneladas, segundo um trader.

 

Em 12 meses, o milho já subiu 71,27% no mercado doméstico, segundo o indicador Esalq/BM&FBovespa, acompanhando, em parte, a valorização no mercado de Chicago. Na bolsa americana, a segunda posição (vencimento maio) subiu 86,33% em 12 meses, para US$ 6,8475 por bushel, de acordo com cálculos do Valor Data.

 

Queda nos estoques de milho e consumo elevado nos EUA – principalmente por causa do etanol -, além da demanda chinesa, têm mantido as cotações firmes. No Brasil, nem a intervenção do governo, que desde novembro já vendeu 1,776 milhão de toneladas de seus estoques, fez os preços caírem. Hoje, a Conab leiloa mais 407 mil toneladas para garantir o abastecimento. “Os preços não caem porque o mercado está atrás de milho”, resume Sílvio Farnese, diretor de programas da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura.

 

Além da demanda firme, Anderson Galvão, da consultoria Céleres, avalia que os estoques de milho projetados pelo governo estão superestimados. Molinari, da Safras, tem opinião semelhante. De acordo com a Conab, os estoques finais na safra 2010/11 totalizam 8,3 milhões de toneladas, entre estoques públicos e privados. Os do governo somam 4,5 milhões.