Anvisa divulga lista dos alimentos com maior nível de contaminação (06/12)
Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo (07/12)
Saiba o que pode ser feito para reduzir a quantidade de agrotóxicos nos alimentos (08/12)
O Jornal Nacional inicia, nesta terça-feira (6), uma série especial de reportagens sobre os perigos do uso descontrolado de agrotóxicos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária acaba de produzir uma lista dos alimentos com maior nível de contaminação. É um documento inédito, que você vai conhecer agora, com os repórteres Mônica Teixeira e Luiz Cláudio Azevedo.
O que vem do campo pode não ter apenas nutrientes, mas também resíduos dos produtos usados para proteger as plantações. Agrotóxico em excesso ninguém quer.
“Como é que a gente vai saber se foi fabricado com agrotóxico se não tem nada aqui indicando?”, questiona uma consumidora.
Uma refeição colorida, com folhas, legumes e frutas, para qualquer pessoa, um prato assim é a tradução de alimentação saudável. Mas quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária analisou o pimentão, morango, pepino, alface e cenoura, descobriu que em pelo menos metade das amostras desses alimentos houve uso indevido de agrotóxicos.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária levou para o laboratório amostras de 18 tipos de alimentos. Em 28% delas, havia excesso de agrotóxicos ou agrotóxicos não autorizados para aquela cultura, o que pode representar um risco maior à saúde.
O caso mais grave é o pimentão. “Desse tamanho aqui? Além de enxerto, tem muito agrotóxico”, afirma uma consumidora.
Em 92% das amostras, foram encontradas irregularidades. O morango teve 63% de amostras irregulares; o pepino, 57%; a alface, 54%; e quase 50% das amostras de cenoura tinham agrotóxicos acima do permitido ou não autorizados. O tomate, que já esteve no topo do ranking, hoje tem menos contaminação, 16,%. E uma boa notícia: na batata, nenhum problema foi encontrado entre as amostras examinadas.
“O agrotóxico no alimento, ao ser ingerido pela população, tem um efeito cumulativo, vai se acumulando no organismo. Pode levar a algum tipo de doença crônica não transmissível”, alerta José Agenor Álvares da Silva, diretor da Anvisa.
“Principalmente neurológicas, endócrinas, imunológicas e hoje a questão do aparelho reprodutor, como infertilidade, diminuição do número de espermatozoides e a questão do câncer”, explica Heloísa Pacheco, coordenadora do ambulatório de Toxicologia da UFRJ.
A médica Silvia Brandalise, pesquisadora da Unicamp, estuda as causas de câncer, principalmente entre crianças. Segundo ela, pesquisas já comprovaram que a exposição aos venenos usados nas plantações está relacionada à leucemia e aos tumores no cérebro. A comida com excesso de agrotóxicos e produtos químicos também faz parte dos fatores de risco.
“Se aquele produto lesa uma célula da formiga, uma célula de um mosquito e leva à morte esse mosquito, de maneira mais aguda. O homem não é diferente. Só que no homem é mais crônico, é de longa duração”, destaca.
E se o contato com o veneno for direto, pior. Osvaldo nunca usou proteção. “O veneno abalou os nervos, então não posso fazer força nenhuma”, conta.
Ainda criança, Márcia acompanhava o pai na aplicação do veneno. “Ele ia botando na frente e a gente ia amarrando o tomate atrás, a gente tomava aquele banho de veneno”, lembra.
A terra hoje está abandonada. O casal, sem condições de trabalhar. O agrotóxico levou mais do que o sustento dessa família.
“Nunca tive alegria para viver. Sempre doente, sempre com problema de saúde”, diz Márcia.
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Mais de 5 milhões de litros de agrotóxico foram despejados em 2010
Os efeitos do uso exagerado nas lavouras chegam rapidamente às cidades
O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Os efeitos do uso exagerado nas lavouras chegam rapidamente às cidades.
É soja a perder de vista. Lucas do Rio Verde é um dos cinco maiores produtores agrícolas de Mato Grosso e um grande consumidor de agrotóxicos: em 2010, mais de cinco milhões de litros foram despejados nas lavouras.
Em Lucas do Rio Verde, a distância entre a zona rural e a zona urbana é muito pequena. O que uma pesquisa mostrou é que os agrotóxicos usados na lavoura já não ficam mais só no campo. Já chegaram à cidade.
O sinal de alerta foi dado pelo pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso, Wanderlei Pignati.
Ele contou com a ajuda de estudantes de escolas públicas. Durante três anos, entre 2007 e 2010, eles coletaram amostras de água. Dos 12 poços de água potável analisados, 83% estavam contaminados com resíduos de vários tipos de agrotóxicos.
Na avaliação da Secretaria Municipal de Saúde, não há risco para a população. “Os resíduos encontrados estão dentro do permitido pela legislação. Estão próprios para consumo humano”, disse Pascoal de Oliveira Júnior, secretário de Saúde.
Mas a pesquisa foi além: constatou que não era só a água potável que estava contaminada. Mais da metade das amostras de água da chuva, também.
O que mais impressionou foi o resultado da análise do leite materno de 62 mulheres que estavam amamentando. Todas as amostras tinham presença de pelo menos um tipo de agrotóxico. Leydiane foi uma dessas mulheres. “A gente nunca imaginava que poderia pegar no leite uma coisa que vem do ar, e ir para no sangue. A gente fica surpreso”, contou a dona de casa Leydiane de Amorim dos Santos.
Para o pesquisador da UFMT, Wanderlei Pignati, a contaminação das mulheres pode ter provocado problemas nas gestações. “A gente verificou que um percentual bastante elevado já tinha tido algum aborto”.
O Brasil é o maior consumidor mundial de agrotóxicos. No ano passado, ultrapassamos a marca de um milhão de toneladas, segundo dados da Anvisa.
A indústria de defensivos agrícolas tem uma explicação: “Um país tropical tem a possibilidade de produzir duas safras dentro de um ano calendário, coisa que os países que têm inverno rigoroso não têm. Mas se eu faço duas safras ou até três safras irrigadas, eu não consigo eliminar a existência de pragas e ervas daninhas, e aí o nosso consumo é maior”, afirmou Eduardo Daher, diretor executivo da Andef.
Não é só a quantidade. O perigo também pode estar nos tipo de agrotóxicos usados no Brasil. Muitos deles já foram banidos em outros países. São 14 os ingredientes ativos, substâncias usadas nas fórmulas dos agrotóxicos que estão na mira da Anvisa.
Mas de 2008 até agora, a agência conseguiu proibir apenas dois e determinou a retirada progressiva do mercado de outros dois. E enfrenta 11 ações na Justiça movidas pelos fabricantes de agrotóxicos.
Essa nova geração quer que a vida no campo seja diferente. “A conscientização é da população e dos agricultores a fim de que eles venham a utilizar esses defensivos de forma racional e na dosagem certa em vez de pensar que precisa produzir mais e não importa o resto”, afirmou Bruno Felipe Camara, de 17 anos.
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Se na cozinha de casa, não dá para se livrar totalmente do agrotóxico, a solução está nos alimentos orgânicos. Mas essa produção, que tem que seguir uma série de regras, ainda é pequena e o preço é para poucos.
Na última reportagem da série sobre agrotóxicos, que o Jornal nacional apresenta nesta semana, os repórteres Mônica Teixeira e Luiz Cláudio Azevedo mostram o que pode ser feito para diminuir a quantidade de produtos químicos nos alimentos.
Lavar, esfregar, tirar a casca. Nem mesmo uma boa limpeza é capaz de remover todo o resíduo de agrotóxicos dos alimentos.
“Você consegue reduzir um pouco dessa química, desse veneno, consegue abrandar, mas você não elimina totalmente”, garante a nutricionista Maria Marquez.
Se na cozinha de casa, não dá para se livrar totalmente do agrotóxico, a solução está no campo: reduzir ou até eliminar o veneno na hora de plantar. Já existem produtores descobrindo um jeito mais natural de produzir o que vai para a mesa dos brasileiros.
No meio das montanhas de Itaipava, Região Serrana do Rio, uma plantação bem diferente da maioria das lavouras tem de tudo um pouco, verduras, legumes, sem uma gota sequer de produto químico.
“O desafio é aprender a lidar com o solo. Se você leva nutrientes ao solo, o solo vai te devolver aquele carinho que você dá para ele”, diz o empresário Dick Thompson.
Alimentos mais limpos, justamente o que as pessoas procuram. “Menos agrotóxico e as coisas plantadas melhor para a terra poder durar um pouquinho mais”, conta um consumidor.
“Nada dessas coisas que a gente sabe que não faz bem a saúde”, destaca uma mulher.
Os alimentos orgânicos, aqueles totalmente livres de agrotóxicos, têm que ser cultivados seguindo uma série de regras. A produção ainda é pequena. São apenas 15 mil agricultores orgânicos registrados, de um total de 5 milhões de produtores agrícolas no país. É por isso que nas prateleiras dos supermercados os produtos ocupam apenas um pequeno espaço. E o preço é para poucos.
Enquanto o pimentão convencional custa, em média, R$ 3,37, o quilo, nas feiras do país, o orgânico sai a R$ 5. No pepino a diferença é ainda maior: de R$ 1,88 para R$ 4,50. E a caixa do morango convencional sai por R$ 3, e a do orgânico, por R$ 4. Esses são os três alimentos em que a Anvisa encontrou mais resíduos de agrotóxicos.
Os orgânicos têm até um selo, um comprovante de garantia atestando que foram produzidos sem veneno e com respeito ao meio ambiente. Plantar assim dá mais trabalho.
É uma das justificativas dos produtores para custar mais caro. A dúvida é: será que dá para produzir em larga escala sem recorrer ao uso de pesticida? “Esses métodos alternativos também são possíveis em grandes áreas. Nós vemos a agricultura orgânica como uma forma de mostrar que existe um caminho alternativo. E isso faz com que o que se trabalha para a agricultura orgânica possa também ser usado para a agricultura convencional”, diz Rogério Dias, coordenador de Agroecologia do Ministério da Agricultura.
Usar produtos menos tóxicos e sem excessos já pode ser uma saída. No interior do Espírito Santo, Seu Domingos usa receitas naturais contra as pragas.
“A gente aplica uma calda de sabão com óleo vegetal. Receita caseira, a gente usa quando aparece um sinal de cigarrinha, alguma coisa”, ele conta.
As plantações da família estão quase livres dos agrotóxicos. “Vantajoso com certeza é quando a gente olha o aspecto humano, social e o aspecto ecológico”, avalia a agricultora Ana Cristina Soprani.
Ainda é preciso incentivar e baratear a produção. Uma mudança no campo pode mudar também a vida na cidade. “Essa opção de comer coisas naturais sem pesticida, isso é uma benção, uma maravilha para a gente”, declara uma mulher.
Extraordinaria esta matéria.
Informo que há alguns meses, enviei sugestões via email, enderereçada ao programa Globo Rural.
A partir da apresentação em edição naicional, por este conceituado telejornal, certamente os Brasileiros em particular os nordestinos, em especial o homem do campo, sem dúvida tera mais cuidado, e buscará a partir de então maiores informações quanto a questão do uso correto de agrotóxico, seja no campo ou mesmo nas cidades, inclusive com os chamados produtos domissanitarios que aparentemente não apresentam contra indicações quando utilizado,principalmente no controle de transmissores de doenças endemicas como o mosquito aedes egypti, vetor da dengue, no entanto podem ocasionar processos alégicos e até convulsões.
O governo sabe que o melhor para a população é ingerir alimentos saudáveis, ou seja, sem os pesticidas (agrotóxicos). Os consumidores têm plena convicção de que o melhor para a sua saúde é o consumo de alimentos livres de agrotóxicos. Aí vem a incoerência do governo admitindo que é preciso contar com os impostos gerados pelos fabricantes. Estes, por sua vez, gananciosos em seus altos lucros, alegam que para atender e saciar a fome do povo só se consegue com o uso de agrotóxico para produção em alta escala. E fica nisso? É preciso a sociedade participar das discussões com vistas a se ter conclusões que, senão consensuais, possam ser aceitas por todos. É a minha opinião.
Parabéns pela matéria. A polêmica deve ser criada, pois a fiscalização, ainda, é muito deficiente. Vislumbro ainda a possibilidade dos alimentos de origem vegetal receberem selos de qualidade, atestando de um modo mais prático, a sua qualidade de alimento seguro. Selos de diferentes tipos, inclusive com responsabilidade técnica de agrônomos responsáveis pela produção. Os produtos mais seguros, produzidos com maior rigor e com maior segurança, devem ser diferenciados inclusive no preço, o que aumenta a responsabilidade e o compromisso de quem produz, bem como valoriza os profissionais envolvidos. Os orgânicos devem ser incentivados, cada vez mais. Porém, o preço ainda impede o consumo pela maior parte da população. Toda divulgação deve ser feita junto a comunidade, visando a implementação de selos de qualidade e da responsabilidade técnica de quem está produzindo. Se isso é feito com produtos industrializados, porque não pode ser feito com produtos primários providos pelo meio rural? Trata-se de uma questão legislativa. Ainda, toda propaganda de agrotóxicos no Brasil é direcionada ao “consumidor”, que no caso é o produtor rural. Porque não direcionarmos a propaganda e as informações de eficiência técnica e toxicológicas aos profissionais responsáveis pela prescrição do receituário agronômico??? Como é feito na área de medicamentos??? Sou professor universitário da área e se depender de informações das empresas formuladoras, pouco saberei para ensinar aos meus alunos, futuros agrônomos. Tenho que me atualizar em congressos, ler periódicos estrangeiros, muitos inascessíveis, mesmo com no portal da CAPES. Todavia, na área médica, os profissionais são supridos com extensos relatórios, dados científicos, amostras gratis etc… Sugiro que a legislação da propaganda para o uso de agrotóxicos seja revista, pois a mesma não pode vislumbrar o “consumidor”, produtor rural e sim o responsável pela prescrisão do receituário agronômico!!!!Não vemos folhetos ou boletins sobre antibióticos, antinflamatórios etc…. Neste caso, a irresponsabilidade do uso de medicamentos recai no próprio consumidor, ou paciente, individualmente. No caso de agrotóxicos, as consequências recaem a todos os consumidores, a toda a comunidade. Ou seja, a responsabilidade de quem prescrever é ainda maior e, portanto, a propaganda e as informações científicas sobre o uso dos agrotóxicos devem ser direcionadas ao técnico responsável pela produção dos alimentos, o agrônomo!!
Os orgânicos têm até um selo!!!!