GAZETA DO POVO / Gazeta Maringá, 08/01/2013
Soja e milho transgênicos embalam a supersafra [título original da matéria]
Sementes geneticamente modificadas ganharam 2 milhões de hectares em ano de plantio recorde, mostra levantamento da Expedição Safra Gazeta do Povo
O plantio de soja e milho transgênicos teve nova expansão no Brasil nesta temporada, crescendo em áreas que eram dedicadas aos grãos convencionais mas não rendiam bônus aos produtores, bem como nas terras que estão sendo destinadas aos grãos pela primeira vez. A participação das lavouras transgênicas aumentou dois pontos porcentuais tanto na soja quanto no milho de verão, chegando a 89% e 85%, respectivamente. O avanço foi apurado pela Expedição Safra durante 28 mil quilômetros de viagens pelas principais regiões agrícolas do país.
As sementes geneticamente modificadas (GMs) da oleaginosa e do cereal ganharam 2,16 milhões de hectares extras (1,72 milhão em Mato Grosso e 232 mil no Paraná), passando de 28,99 milhões para 31,15 milhões (ha). Isso numa temporada em que o incremento na área plantada, considerando sementes GMs e convencionais, somou 1,63 milhão de hectares nas duas culturas. A colheita dos dois produtos, que deve atingir a marca recorde de 118 milhões de toneladas, cresce com o uso da transgenia.
Houve aumento real na participação dos transgênicos nas lavouras brasileiras, embora a expansão tenha perdido ritmo, avaliou o agrônomo Robson Mafioletti, técnico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar) que participa da Expedição Safra, projeto da Gazeta do Povo desenvolvido desde a temporada 2006/07.
Os 2,16 milhões de hectares equivalem a 6,09% do que o país planta nas duas culturas em 2012/13. Esse avanço, por outro lado, é o menor desde a liberação do plantio comercial de soja transgênica no Brasil, seis safras atrás. Na duas últimas temporadas, o incremento foi de 2,62 milhões (2011/12) e 6,21 milhões de hectares (2010/11), considerando soja e milho.
Tanto quem planta convencional quanto quem usa sementes GMs aponta como critérios a relação entre custo e rendimento e as questões agronômicas. “Mantenho 20% da área da soja com variedades convencionais para que possamos alternar o uso de agrotóxicos de diferentes princípios ativos”, justifica Luis Alberto Novaes, que dedica 1,8 mil hectares à oleaginosa em Maracaju (MS).
Os bônus pagos aos produtores de soja convencional limitam a expansão da semente tolerante ao glifosato, mas frequentemente cobrem apenas custos adicionais. Os entrevistados relataram receber de R$ 2 a R$ 4,5 a mais por saca de soja não transgênica quando conseguem contratos especiais. A maioria comentou que esse adicional equivale às despesas extras com segregação e à queda na produtividade que acontece quando há infestação de plantas daninhas.
O predomínio dos transgênicos reduziu a disponibilidade de sementes convencionais no mercado, disse o produtor Hendrik Barkema, de Tibagi (PR). Dessa forma, mesmo quando o bônus é atraente, muitos produtores seguem plantando grãos GMs, contou.
Os casos de aumento na participação dos grãos convencionais são raros e apresentam variações pequenas. Na zona de abrangência da cooperativa Castrolanda, de Castro (PR), as sementes de soja não modificadas passaram de 7% para 10% da área plantada, disse o gerente de Negócios da empresa, Márcio Copacheski. Esses produtores esperam receber R$ 4 a mais por saca. No caso do milho, acrescenta o dirigente, não há segregação e a área dos transgênicos se aproxima dos 90%.
Nicho da soja convencional dá lucro e deve se expandir
Quem aproveita o nicho de mercado da soja convencional consegue lucrar mais do que se produzisse soja transgênica. A avaliação é do diretor técnico da Associação Brasileira de Produtores de Grãos Não Geneticamente Modificados (Abrange), Ivan Paghi. Ele afirma que a própria expansão do uso da transgenia estimula a oferta de bonificação por parte dos importadores que buscam grãos tradicionais.
“Países como a Alemanha estão se fechando cada vez mais aos transgênicos. Existem empresas oferecendo R$ 5 de bônus por saca de soja convencional em Sorriso [MT], e sobre um preço de R$ 60”, comemora. “Quanto mais transgênico, melhor para o produtor de grão convencional”, pontua.
Um prêmio de R$ 3 por saca representa renda extra de R$ 180 mil a cada mil hectares, aponta, considerando produtividade de 60 sacas por hectare. O executivo soma como lucro ainda R$ 24 por hectare, valor médio referente aos royalties que deixam de ser pagos. “São R$ 204 mil a cada mil hectares. Um produtor com dez mil hectares pode arrecadar R$ 1 milhão a mais por safra.”
O diretor técnico da Abrange avalia que os custos de produção do grão convencional se iguala ao do geneticamente modificado, dependendo das opções dos produtores, e que há disponibilidade de sementes convencionais tão produtivas quanto as transgênicas oferecidas pelas revendedores.
A Abrange foi criada em 2008 para mostrar que há mercado para os produtos convencionais. Estima que as sementes convencionais ainda ocupam ao menos 20% das lavouras de soja e milho brasileiras. Segundo Paghi, grandes produtores estão investindo na produção convencional, que deve voltar a crescer. A indústria de sementes, por outro lado, aposta na adoção cada vez maior dos transgênicos, multiplicando cada vez mais variedades modificadas.
O mercado prevê novo salto da soja GM em 2013/14, quando deve estar disponível para cultivo comercial a soja RR2. A semente vem sendo multiplicada mas ainda enfrenta restrições por não ter sido aprovada na China, principal cliente da soja brasileira. A Monsanto, detentora da tecnologia, informou que ainda aguarda a liberação chinesa.
Expansão segue ritmo do mercado e compasso da oferta de semente
No Paraná, as sementes de soja e milho geneticamente modificadas (GMs) atingiram 40% das lavouras logo na estreia. Depois, foram avançando aos poucos até chegarem perto de 90%, o que parece ser um ponto de equilíbrio. Em sua sétima temporada, a soja tolerante a herbicida está com 89% da área plantada. Com três safras de verão, o milho resistente a insetos – agora também tolerante a herbicidas – alcança 88% das plantações no estado. Entretanto, essa evolução gradual e contínua tem seguido ritmos diferentes, dependendo da região do país.
No Rio Grande do Sul, que plantava soja transgênica antes mesmo da liberação comercial em 2006/07, as sementes modificadas atingem 99% da área da oleaginosa, como em nenhum outro estado. Em Mato Grosso, líder na sojicultura, a participação da semente GM se limita a 82%, com grandes grupos assumindo a segregação e buscando contratos de exportação que garantam adicionais para a soja convencional. Na nova fronteira agrícola brasileira, o Centro-Norte, os transgênicos avançam à medida que as variedades mais produtivas ganham versões GMs, conversão que ocorreu primeiro nas demais regiões do país. Esse quadro fez do Brasil o segundo maior produtor de grãos transgênicos do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Das 118 milhões de toneladas soja e milho que estão sendo produzidas, 102,6 milhões são geneticamente modificadas. As outras 15,4 só podem ser consideradas convencionais se forem separadas.