Nota editorial pela AS-PTA

Com esta edição, a AS-PTA inaugura a publicação mensal do Boletim Sementes Crioulas – Porum Brasil Ecológico, Livre de Transgênicos e Agrotóxicos. Ele dá continuidade ao boletim semanal por nós editado e distribuído durante 15 anos para um público de cerca de 10 mil pessoas.

Desde 1999, ano de lançamento de nosso antigo boletim, denunciamos com informações e análises atualizadas as “falsas promessas” propagadas pelos defensores dos transgênicos. Contrariando uma das principais promessas, afirmávamos que a disseminação dos OGMs nas lavouras brasileiras criaria as condições propícias para o aumento exponencial do uso de agrotóxicos. Infelizmente, esse prognóstico se confirmou, repetindo a realidade de países vizinhos àquela altura mais avançados na liberação dos transgênicos. Como resultado, oBrasil ostenta há quase 10 anos o tenebroso título de campeão mundial no consumo de agrotóxicos. Os resultados positivos em termos de eficiência produtiva alardeados pelas empresas produtoras dos transgênicos também não vieram. Como já antecipávamos nos boletins, as lavouras transgênicas não produzem mais que as convencionais, embora seus
custos de produção tenham aumentado substancialmente.

Apesar dessa evolução negativa, é importante ter em mente que a ação articulada e bem informada das organizações integradas à Campanha Por Um Brasil Ecológico, Livre de Transgênicos e Agrotóxicos foi determinante para retardar por anos o ritmo de liberação dos transgênicos. Para seguir na luta, agora em um contexto bastante mais adverso, torna-se necessário atualizar estratégias e focos de atenção.

Ao dar visibilidade às variadas formas como famílias agricultoras e suas organizações locais atuam na defesa da agrobiodiversidade, o novo boletim desloca o seu foco principal de atençãoda arena institucional para os territórios onde famílias agricultoras e suas organizações locais empenham-se no dia-a-dia na construção da agroecologia e na produção de alimentos saudáveis. É nos territórios onde a ameaça de contaminação genética pelos transgênicos compromete as variedades locais conservadas e aprimoradas por gerações como patrimônio técnico-econômico e biocultural da agricultura brasileira. Portanto, é nos territórios onde brotam as lutas de resistência mais efetivas contra os transgênicos e os agrotóxicos.

Pensado como veículo de informação e análise da realidade, o Boletim mantém como principal vocação a de subsidiara intervenção social e política de todas as pessoas e instituições comprometidas com a defesa do direito humano à alimentação adequada e saudável e com o projeto de democratização e de sustentabilidade para o mundo rural. Com essa motivação e com as contribuições que esperamos desse público, a AS-PTA espera continuar contribuindo para as lutas de resistência contra os transgênicos e os agrotóxicos.

 

Trajetórias da Conservação da Agrobiodiversidade no Centro-Sul do Paraná: das Sementes Crioulas aos Derivados do Milho Ecológico

O dia 23 de outubro de 2019 foi de alegria e de realização de sonhos no município de São João do Triunfo, Paraná. Agricultoras, agricultores, Guardiãs e Guardiões de sementes, representantes do poder público, sindicatos rurais, associações, cooperativas e organizações de assessoria se reuniram para a inauguração da Unidade Agroindustrial de Beneficiamento do Milho Crioulo Ecológico. A Agroindústria, gerida coletivamente por cooperativas da agricultura familiar, receberá milho produzido por famílias guardiãs de sementes crioulas e beneficiará alimentos como a canjica, o fubá e a quirera. Para
assegurar que os grãos não estejam contaminados por OGMs, eles serão testados antes do processamento na agroindústria.

Além de produzir comida de verdade, sem contaminação por agrotóxicos ou transgênicos, a proposta da agroindústria é conectar produtores/as e consumidores/as, estreitando laços entre campo e cidade. Dois mercados já estabelecidos pela Agroindústria envolvem a parceria com o poder público local para a venda dos derivados de milho ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e ao Programa Municipal de Aquisição de Gêneros Alimentícios da agricultura familiar, que garantirão alimentos saudáveis nas escolas e creches públicas.

Além de saudar a nova agroindústria, essa matéria descreve a trajetória de conquistas e conflitos no Centro Sul do Paraná onde, nas famílias e comunidades, agricultores e agricultoras se organizam há décadas para defender a agrobiodiversidade e promover a agroecologia. Clique aqui para saber mais.

  

Feiras, histórias e intercâmbios do Coletivo Triunfo

  

Sementes crioulas na mídia

Resistências à contaminação por variedades transgênicas

A entrevista concedida por Luciano Marçal Silveira, assessor técnico da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia, alerta sobre a contaminação das sementes crioulas por variedades transgênicas. Na Semiárido, por exemplo, de 900 testes de transgenia realizados pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) com variedades de milhos crioulos, aproximadamente 1/3 revelaram contaminação. Frente a esse desafio, Luciano destaca a potencialidade de ações como o “Programa Sementes do Semiárido” da ASA e do recém iniciado
“Programa Agrobiodiversidade do Semiárido”, desenvolvido pela parceria entre a ASA e a Empresa Brasileira de Pesquisa e Agropecuária (EMBRAPA), que articula saberes científicos e tradicionais na conservação das sementes crioulas. (UNISINOS)

Guardiões/as de sementes crioulas do território da Borborema-PB participaram da pesquisa “Raças de Milho das Terras Baixas da América do Sul” e colaboraram para a identificação de 68 variedades de milho, que correspondem a 18% de todas as variedades crioulas de milho identificadas no Brasil. Além da grande biodiversidade, a pesquisa concluiu que quatro raças de milho são exclusivas desse território. Segundo Natália Almeida, uma das pesquisadoras responsáveis, “podemos afirmar com certeza que a região do
Polo da Borborema é uma zona de conservação da biodiversidade no Brasil.”. (AS-PTA)

O momento de apresentação da pesquisa aconteceu durante o Encontro de Guardiãs e Guardiões das Sementes da Paixão do Polo da Borborema, envolvendo 60 Bancos de Sementes Comunitários da Região e mais de 80 representantes!

Mundo a fora…

A ativista e estudiosa Vandana Shiva em colaboração com dois outros autores publicou o livro “Sementes do Sustento e da Liberdade vs Sementes do Suicídio e do Controle”. A produção traz um resgate histórico das imposições da modernização da agricultura a partir da Índia passando por três momentos: as sementes milagrosas, as sementes geneticamente modificadas e as sementes do controle (ou da Era do capitalismo digital).

Nos Estados Unidos as sementes ancestrais dos povos indígenas correm perigo, como conta o agricultor indígena Clayton Brascoupé que cultiva mais de 60 variedades de plantas. Dentre os principais desafios de conservação estão as tentativas das grandes corporações em cooptar a biodiversidade e torná-la lucro. Em esforço de conter o desaparecimento e a
desestruturação social e ecológica, seis senadores, em parceria com as comunidades nativas, encaminharam um projeto de lei que prevê múltiplas ações de conservação.

A revista de Agroecologia LEISA preparou uma edição sobre agrobiodiversidade e sementes crioulas na agricultura familiar camponesa. São artigos que trazem histórias, práticas e ações de conservação do patrimônio genético e cultural das sementes por agricultoras, povos e comunidades tradicionais na Colômbia, na Argentina, no Peru e em Cuba.

Aqui, bem mais pertinho

O Grupo de Trabalho Biodiversidade da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) se reuniu durante dois dias do mês de Setembro no Paraná. Entre as temáticas abordadas destacam-se a necessidade de articulações cada vez mais estreitas com as experiências territoriais, análises de ferramentas associadas à regularização fundiária e construção de protocolos em referência às convenções internacionais. No âmbito da valorização das práticas e ações dos territórios o encontro do GT contou com a presença da Rede Sementes da Agroecologia
(ReSA), da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), do Movimento Camponês Popular (MCP) e da Bionatur, que compartilharam suas práticas e ações para a conservação das sementes crioulas. (Terra de Direitos)

Tóxico. Não dá para não falar.

Desde o começo do ano até a publicação deste Boletim o Governo Bolsonaro (PSL), com atuação ativa da Ministra Tereza Cristina, liberou 410 registros de agrotóxicos. Número maior do que todos os anos anteriores, a exceção de 2018, quando a liberação no Governo Michel Temer (PMDB), atingiu 450 produtos (!). As importações, porém, quando comparadas ao mesmo período do ano passado subiram 21%. (Folha de São Paulo)

Na contracorrente, porém…

Florianópolis, Santa Catarina, se torna o primeiro município a banir agrotóxicos. A Lei aprovada por votação unânime na Câmara dos Vereadores e sancionada pelo Prefeito define como crime a aplicação de qualquer tipo de agrotóxico na área do município. O texto prevê a criação de uma Zona Livre de agrotóxicos, ações educacionais sobre os malefícios desses produtos e articulações com a já existente Política Municipal de Agroecologia e Produção Orgânica. (Agência Pública)

  

Recomendamos:

Conhecer um pouquinho mais sobre as sementes crioulas do Semiárido, em uma mistura de paixão, vida, resistência, partilha, luta e muitos mais. Nessa coleção de vídeos produzidos pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) você encontra um tanto dessas histórias.

O curta “Semilla Róga: recuperando semillas con Conamuri”, que conta sobre o resgate, a defesa e o cuidado das comunidades camponesas e indígenas com suas sementes.

O documentário “Sementes: bem comum ou propriedade corporativa?” do Coletivo de Sementes da América Latina – “tudo começou com uma semente”.

A animação elaborada pelo Grupo de Trabalho Biodiversidade da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) que alerta sobre a biotecnologia dos genes drives. Não se deixe manipular!

O Boletim “Teia Agroecológica”, produzido pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) que apresenta 22 Tecnologias Sociais desenvolvidas e experienciadas por Redes de Agroecologia territoriais.

O “Joio no Rótulo”, que a partir de análises sobre os rótulos dos produtos ultraprocessados levanta a questão – do que você se alimenta?