Mais promessas…
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Zero Hora, 04/08/2014
Maior produtor mundial de celulose, o Brasil está perto de despontar como o primeiro país a liberar comercialmente o plantio de eucalipto geneticamente modificado. Experimentos de empresas florestais estão em campo há quase uma década e uma variedade transgênica que promete produtividade 20% maior — em tempo de crescimento — poderá ser aprovada ainda neste ano pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). A introdução de um novo gene na planta reduziu de sete para cinco anos e meio o período entre plantio e colheita e aumentou o diâmetro do tronco.
A biotecnologia que permite árvores com crescimento mais rápido, por meio de clones transgênicos, promete ampliar o ganho do setor florestal, que responde por 6% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial. Esse segmento da indústria extrativista movimentou R$ 60 bilhões em 2013.
— Essas variedades permitirão que a mesma área plantada renda uma quantidade maior de celulose. Produzir mais madeira por hectare vai nos tornar ainda mais competitivos — destaca João Fernando Borges, presidente da Associação Gaúcha de Empresas Florestais (Ageflor).
Com experimentos em campo há oito anos, a Futuragene, empresa de biotecnologia da Suzano Papel e Celulose, protocolou pedido de liberação comercial de variedade transgênica na CTNBio em janeiro deste ano.
— Cultivamos experimentos no interior de São Paulo, no sul da Bahia e no Piauí, onde as variedades aumentaram em 20% o volume de metros cúbicos de madeira por hectare — explica Eugênio César Ulian, vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Futuragene, empresa com sede em Itapetininga (SP).
Na quinta-feira da semana passada, o projeto foi colocado em votação em reunião da CTNBio. Com pedido de vista, a matéria foi retirada de pauta e deverá ser reavaliada em setembro. A liberação será discutida nos próximos meses em audiência pública, para então ser submetida à avaliação final dos 27 membros.
— Queremos iniciar o plantio logo após a aprovação. A primeira colheita chegará ao mercado em até sete anos depois — diz Ulian.
Pelo menos 15 empresas florestais desenvolvem pesquisas laboratoriais e experimentos de campo de variedades geneticamente modificadas no país, com autorização da CTNBio. Nos Estados Unidos, as pesquisas e pedidos de liberação comercial são de eucaliptos mais resistentes ao frio.
— No Brasil, a maioria das pesquisas é para alteração da composição da madeira, com objetivo de produzir árvores com mais celulose e menos lignina — explica o professor Giancarlo Pasquali, pesquisador do Centro de Biotecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Membro da CTNBio de 2006 a 2009, o professor não vê dificuldades na aprovação dos pontos de vista técnico e científico. A variedade transgênica desenvolvida pela Futuragene, em análise pelo órgão, não envolve a redução de lignina, apenas o crescimento mais rápido da planta. A lignina é um dos principais elementos da madeira, responsável pela rigidez do material. Em menor quantidade, facilita a retirada de celulose.
— São anos de cultura de eucalipto no Brasil, com cruzamento e polinização de árvores. Os objetivos da transgenia nesse caso são os mesmos do melhoramento genético — aponta.
Se aprovado pela CTNBio, o plantio comercial da variedade ainda precisa da avaliação do Conselho Nacional de Biossegurança, ligado ao Ministério do Desenvolvimento, que analisa aspectos sociais, políticos e econômicos. Normalmente, o conselho costuma referendar as decisões tomadas pela CTNBio [o Conselhoé na verdade ligado à Casa Civil e não se reúne nem emite um único ato desde 2008. Portanto, é por omissão que o CNBS referenda as decisões da CTNBio].
Principal matéria-prima para a indústria florestal
Originário da Austrália, o eucalipto é a espécie com maior área plantada no Brasil para a produção de celulose e papel. Com 5,1 milhões de hectares cultivados no país, é a principal matéria-prima para a indústria florestal. Desse total, o Rio Grande do Sul responde por 301 mil hectares — pouco mais de 5%. Na indústria, a participação gaúcha no setor é ainda menor: 3% de celulose e 2% de papel.
— A produção do Estado ainda é pequena, mas temos potencial para avançar muito mais — avalia Walter Lídio Nunes, diretor-presidente da Celulose Riograndense.
Instalada em Guaíba, a empresa está concretizando o maior investimento privado da história gaúcha — de R$ 5 bilhões — para ampliar a unidade. Desde o ano passado, já foi investido mais de R$ 1 bilhão.
— O Brasil já tem materiais genéticos destacados no mundo. Com florestas ainda mais produtivas, teremos mais tranquilidade para ampliar nossas bases produtivas — acrescenta o executivo.
A maior relevância do Estado na atividade, hoje, é na indústria de painéis de madeira. Cerca de 30% do volume produzido no país têm origem no Rio Grande do Sul.
Contaminação de florestas é o maior risco
Se para a indústria de celulose e papel o eucalipto transgênico poderá ampliar os ganhos, para outros setores o impacto dessa variedade é questionado. Pesquisador florestal, o professor Paulo Kageyama, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP), explica que a maioria dos experimentos no país são para reduzir a quantidade de lignina, facilitando a retirada de celulose.
A aprovação comercial no Brasil de uma variedade com menos lignina, avalia o pesquisador da USP, é uma estratégia de mercado que interessa somente ao setor de celulose e papel.
A substância reduzida no processo de modificação genética, porém, é importante para setores como indústria de móveis, construção, energia, óleo e mel.
— O risco é de contaminação de florestas não transgênicas por meio da polinização de abelhas, que voam mais de mil metros — avalia Kageyama.
Diretor da AS-PTA — Agricultura Familiar e Agroecologia, Gabriel Fernandes diz que o aumento da produtividade é uma promessa antiga da indústria de biotecnologia e ainda não cumprida:
— A produtividade de uma cultura depende de uma série de fatores interligados que vão muito além da genética da planta. Não é diferente com o eucalipto.
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